Os homens que não amavam as mulheres é baseado na série de livros de Stieg Larsson (se quiserem me presentear com os livros ficarei muito grata rs) que conta a história do dono de agência Mikael Blomqvist – chamada de Milennium – que perdeu recentemente um caso bem problemático de difamação para um de seus “aqui-inimigos” “que é o empresário bem corrupto Hans-Erick Wennerström.
Mikael Blomqvist tem certeza que sua carreira e prestígio estão acabados e faz seu “draminha” que confesso que tive vontade de bater nele, porque nunca vi homem mais “frouxo” e molenga como ele… continuando – no colo de sua amante, que também é da revista, e é uma mulher forte, decidida e realista (também escolheram a atriz que faz a esposa do deputado Underwood em House of Cards….aquela mulher transpira elegância e bom senso). Só que ele foi “contrato” – leia-se convocado – por um magnata que quer respostas pelo sumiço de sua sobrinha Harriet há quarenta anos e seu pagamento seria informações comprometedoras sobre Wennerström.
Paralelamente, temos a aparição de Lisbeth Salander, uma jovem que foi taxada com problemas de controle emocional e incapacidade de se socializar com as pessoas. Ela sempre teve uma vida difícil e percebemos isso quando seu novo “tutor” legal a chantagear com favores sociais nojentos quando ela precisa de dinheiro, mas como ela mesma diz “sou louca”, Lis faz uma bela vingança contra ele.
Ela grava o estupro dela que foi a coisa mais horrorosa e nojenta que vi e quase tive um desmaio e com isso ameaçou de colocar na internet (ela é uma hacker) e entrega-lo às autoridades máximas para ser morto numa cela. Não satisfeita, ela filma os dois transando – dessa vez por vingança dela – e tatuando o peito dele com os seguintes dizeres “Eu sou um porco estuprador.” É aí que percebemos que parte de sua raiva e insegurança nas pessoas é porque ela foi maltratada por quase todos que a rodeavam, mas conseguiu se equilibrar com muita força de vontade e coragem.
Ela é chamada por Mikael para trabalhar juntamente com ele na investigação do sumiço misterioso de Harriet, porque a jovem sumiu num dia que teve acidente na ponte que ligava a mansão de sua família a cidade natal deles e naquele mesmo dia o rio que circula a cidade está com as águas muito geladas para alguém nadar e a Guarda-Costeira não viu nenhum barco navegando. Então o que aconteceu com Harriet? Sumiu sem ninguém ver? Foi assassinada? Fora sequestrada? Então por que não pediram qualquer resgate?
Enquanto Lisbeth investiga fotos, documentos históricos e emails da família magnata e corre sérios riscos, porque tem pessoas – familiares – que sabem a verdade sobre aquele último dia de Harriet. Mikael está na cola de outros parentes mais próximos de seu contratante e que despertam maior atenção dele.
Confesso que a complexidade do caso é o grande atrativo do filme, porque a obra é baseada nos livros de Stieg que escreveu essa série em homenagem a uma jovem que conheceu durante sua juventude e que tinha sido vítima de estupro e apenas um caso de uma série de outras monstruosidades e crueldades contra as mulheres.
Essa obra não é um romance e muito menos termina com um final feliz. Sabe aquelas construções históricas que são feitas para dizer assim “Olha o problemão que existe no mundo e vocês perdendo tempo comendo fast-food e assistindo séries de tv!”, então é isso que o autor quis passar.
Mikael achava que reputação era algo muito importante e seus dilemas eram as problemáticas mais preocupantes do momento, mas quando conheceu a história de sua companheira nessa investigação, a de Harriet e tantas outras mulheres, ele percebeu que seu problema era apenas um draminha num mundo de crueldades e crimes hediondos. Ele percebeu que o ser humano anda “doente” de atenção que faz qualquer coisa para receber migalhas de “amor” e opta até por crimes para ganhar o que tanta almeja.
Lisbeth é uma personagem extremamente fechada e não dar abertura para falar de seus problemas e feridas que ainda estão em carne viva em seu corpo. Em nenhum momento ela fala que foi abusada, violentada ou que vive sozinha – apenas diz de seus problemas “mentais”- e Mike apenas percebe que ela esconde coisas obscuras e dolorosas e quando está junto dela tenta a todo custo dar-lhe amor e proteção e ela deixa e acaba se apaixonando por ele – pior erro que ela cometeu – e assim um clima mais “leve” surge na história.
Assim como no livro/filme Memórias de uma Gueixa temos um enredo pautado na denúncia e na sensibilização da sociedade para o número crescente de casos de violência contra as mulheres e os diversos tipos de abusos – que vão do verbal até o físico – e que são vistos como “comuns”, “normais” e “aceitáveis” dentro da sociedade.
Não é um filme sobre machismos, mas sobre como enxergamos ambos os gêneros e como os julgamos baseando suas funções sociais em nossas crenças religiosas, moralidade e pensamentos construídos no seio familiar. Lisbeth é a personificação do nome do livro “Os homens que não amam as mulheres “, porque é usada e abusada sempre e percebe isso, todavia aceita porque acha aquilo biologicamente definido ou socialmente aceitável e torna-se marionete nas mãos de homens usurpadores, maldosos e inescrupulosos que procuram mulheres – e em alguns casos homens – que sejam fracos emocionalmente e maleáveis aos seus discursos de superioridades e após conquistarem o que querem descartam suas vítimas sem dor ou piedade, porque em suma são “doentes” socialmente falando ou cruéis naturalmente.
Milennium: Os homens que não amam as mulheres é uma obra chocante, visceral e cativante pela brutalidade verídica que utiliza para chamar a atenção do telespectador para além de suas preocupações diárias que em grande maioria são fúteis e assim se aproxima da genialidade e delicadeza da escrita de Stieg Larsson que criou uma série com cunho verossímil e tocante.